O presente artigo tem por objetivo analisar e caracterizar a evolu��o da pol�tica ambiental brasileira no s�culo XX e as suas tend�ncias internas a partir da emerg�ncia da quest�o ambiental no cen�rio internacional. Segundo Magrini [i], a evolu��o da pol�tica ambiental pode ser descrita atrav�s de importantes marcos de refer�ncia, isto �, grandes acontecimentos internacionais ocorridos a partir da segunda metade do s�culo XX, que influenciaram o curso das pol�ticas ambientais no mundo e, conseq�entemente, no Brasil.� Houve, nesse per�odo, segundo Magrini, o desenvolvimento de tr�s �ticas em rela��o � quest�o ambiental: a �tica corretiva (preponderante nos anos 1970), a �tica preventiva (preponderante nos anos 1980) e finalmente, a �tica integradora (caracter�stica dos anos 1990), que fornece a base te�rica para a elabora��o das a��es pol�ticas ambientais atuais. Veremos ainda que a pol�tica ambiental brasileira propriamente dita se desenvolveu de forma tardia se comparada �s demais pol�ticas setoriais brasileiras, e basicamente em resposta �s exig�ncias do movimento internacional ambientalista. Na hip�tese defendida pelo presente trabalho, a abordagem setorial corretiva e n�o integrada da quest�o ambiental por parte dos elaboradores de pol�ticas p�blicas brasileiros, aliada � vis�o governamental da �poca de que a prote��o ambiental n�o deveria sacrificar o desenvolvimento econ�mico do pa�s, constitu�ram os principais entraves para a inser��o do componente da sustentabilidade no modelo de desenvolvimento econ�mico brasileiro.
��������� Durante s�culos, o desenvolvimento econ�mico decorrente da Revolu��o Industrial impediu que os problemas ambientais fossem considerados. O meio ambiente era predominantemente visto como acess�rio do desenvolvimento, e n�o como parte intr�nseca dele. A polui��o e os impactos ambientais do desenvolvimento desordenado eram vis�veis, mas os benef�cios proporcionados pelo progresso os justificavam como um �mal necess�rio�, algo com que se deveria resignar [ii].
O pa�s que primeiro percebeu a necessidade e urg�ncia da interven��o do poder p�blico sobre as quest�es ambientais foram os Estados Unidos, ainda na d�cada de 1960. Paradoxalmente, o pa�s considerado o para�so do n�o-intervencionismo foi que primeiro promoveu a interven��o regulamentadora no meio ambiente, atrav�s da �Avalia��o dos Impactos Ambientais� (AIA), formalizada nos Estados Unidos em 1969 [iii].
No caso do Brasil, a pol�tica ambiental brasileira nasceu e se desenvolveu nos �ltimos quarenta anos como resultado da a��o de movimentos sociais locais e de press�es vindas de fora do pa�s. Do p�s-guerra at� 1972 � ano da Conferencia de Estocolmo �, n�o havia propriamente uma pol�tica ambiental, mas sim, pol�ticas que acabaram resultando nela. Os temas predominantes eram o fomento � explora��o dos recursos naturais, o desbravamento do territ�rio, o saneamento rural, a educa��o sanit�ria e os embates entre os interesses econ�micos internos e externos. A legisla��o que dava base a essa pol�tica era formada pelos seguintes c�digos: de �guas (1934), florestal (1965) e de ca�a e pesca (1967) [iv]. N�o havia, no entanto, uma a��o coordenada de governo ou uma entidade gestora da quest�o.
Nessa �poca, o desenvolvimento do pa�s tinha como uma de suas bases o investimento p�blico nas �reas de petr�leo, energia, siderurgia e infra-estrutura, associado aos capitais privados investidos nas ind�strias de transforma��o, que viabilizavam a industrializa��o por substitui��o de importa��es. Na d�cada de 1960, por�m, esse modelo de desenvolvimento foi sendo redefinido e, ao final da d�cada, em fun��o da polui��o gerada por tais atividades, demandas ambientais come�aram a surgir [v].
Em 1970, um relat�rio formulado pelo Clube de Roma em associa��o com o grupo de pesquisas do Massachusetts Institute of Technology (MIT) foi publicado com o titulo de Limites do Crescimento. Esse documento apresentava modelos que relacionavam vari�veis de crescimento econ�mico, explos�o demogr�fica, polui��o e esgotamento de recursos naturais [vi], com �nfase nos aspectos t�cnicos da contamina��o � devido � acelerada industrializa��o e urbaniza��o � e no esgotamento dos recursos naturais [vii], em fun��o da explos�o demogr�fica. Os objetivos desse documento eram: obter uma vis�o mais clara dos limites do planeta e das restri��es que ele impunha � popula��o e �s suas atividades e identificar os elementos que influenciavam o comportamento dos sistemas mundiais e suas intera��es, advertindo para uma crise mundial, caso essas tend�ncias se perpetuassem.
Dois anos depois, foi promovida na cidade de Estocolmo a Conferencia das Na��es Unidas para o Meio Ambiente, da qual o Brasil foi um dos participantes. As quest�es ambientais levantadas diziam respeito �s polui��es do ar; da �gua e do solo derivadas da industrializa��o, as quais deveriam ser corrigidas. O objetivo dessa reuni�o era encorajar a a��o governamental e dos organismos internacionais para promover a prote��o e o aprimoramento do meio ambiente humano. As propostas apresentadas na Confer�ncia de Estocolmo tiveram como base os dados divulgados pelo relat�rio do Clube de Roma. No entanto, tanto a an�lise dos problemas quanto as medidas propostas para a sua solu��o tinham um car�ter muito pontual, privilegiando basicamente a corre��o dos problemas apontados.
Dessa confer�ncia resultaram os princ�pios que representaram compromissos entre as na��es. Ela recomendava ainda a assist�ncia t�cnica e financeira, atribuindo a �institui��es nacionais apropriadas, as tarefas de planejamento, gerenciamento e controle dos recursos ambientais� [viii]. A posi��o do Brasil em rela��o �s quest�es ambientais colocadas pela conferencia, endossada pelos demais pa�ses do chamado Terceiro Mundo, foi bastante clara: o crescimento econ�mico n�o deveria ser sacrificado em nome de um ambiente mais puro. Os delegados brasileiros at� reconheceram a amea�a da polui��o ambiental, mas sugeriram que os pa�ses desenvolvidos deveriam pagar pelos esfor�os dessa purifica��o. Al�m disso, o Brasil discordou da rela��o direta entre crescimento populacional e exaust�o dos recursos naturais, opondo-se fortemente �s propostas de medidas de controle de natalidade [ix].
Um terceiro componente sustentado pela posi��o brasileira causou ainda muita pol�mica: segundo os delegados brasileiros, a soberania nacional n�o poderia ser mutilada em nome de �interesses ambientais mal-definidos�. O princ�pio da soberania nacional, o direito de uma na��o explorar seus recursos de acordo com as suas prioridades, foi obsessivamente declarado pelo Brasil. Uma das raz�es para isso dizia respeito � disputa com a Argentina em torno do uso da Bacia do Prata. Assim, os elementos b�sicos da pol�tica externa brasileira da �poca � de afirma��o da sua soberania no sentido de optar por n�o sacrificar o desenvolvimento econ�mico em nome do meio ambiente � �sairiam assim vitoriosos de Estocolmo e viriam ent�o a modelar as pol�ticas ambientais internamente� [x].
Em 1973, pouco depois da Confer�ncia de Estocolmo, foi criada no Brasil a Secretaria Especial de Meio Ambiente (Sema), �rg�o especializado no trato de assuntos ambientais sob a coordena��o do Minist�rio do Interior.� A Sema se dedicava ao avan�o da legisla��o e aos assuntos que demandavam negocia��o em n�vel nacional, tais como a produ��o de detergentes biodegrad�veis, a polui��o por ve�culos, a demarca��o de �reas cr�ticas de polui��o e a cria��o de unidades nacionais de conserva��o. De fato, as medidas de Governo se concentravam na agenda de comando e controle, normalmente em resposta a den�ncias de polui��o industrial e rural.
O modelo da pol�tica ambiental brasileira elaborada a partir da Confer�ncia de Estocolmo tinha assim como pilares: o controle da polui��o e a cria��o de unidades de conserva��o da natureza. O crescimento populacional e o saneamento b�sico � componentes de pol�ticas setoriais de impacto sobre o meio ambiente � ficaram exclu�dos desse modelo, constituindo, cada um, objeto de pol�tica pr�pria, n�o articuladas � quest�o ambiental, o que evidenciou o desenvolvimento isolado deste setor.
O modelo institu�do e coordenado nacionalmente pela Sema era ainda executado de forma descentralizada pelos �rg�os estaduais de meio ambiente nos estados de maior desenvolvimento, como S�o Paulo e Rio de Janeiro. O ponto de partida para a estrutura��o da pol�tica de controle de polui��o nesses estados foi a cr�tica � atua��o dos �rg�os estaduais de controle ambiental at� ent�o existentes, principalmente � Companhia Estadual de Tecnologia de Saneamento B�sico e Controle da Polui��o � a Cetesb � do Estado de S�o Paulo e ao IES � Instituto de Engenharia Sanit�ria. A �nfase dada por esses �rg�os em medidas setoriais de cunho eminentemente corretivo/repressivo fora considerada inadequada dentro de uma perspectiva de se ver o meio ambiente de forma mais integrada e abrangente [xi]. Nesse contexto, surgiu no Rio de Janeiro a Funda��o Estadual de Engenharia do Meio Ambiente (Feema).
Segundo Paulo Gonzaga M. de Carvalho [xii], apesar da primeira administra��o da Feema haver tentado esbo�ar algumas medidas nesse sentido, o que predominou na primeira d�cada de seu funcionamento (1975-85) foi uma pol�tica de controles administrativos. Essa pol�tica, como Carvalho ressalta, �apresentou s�rios problemas de concep��o e implementa��o� [xiii]. No per�odo, preponderava no governo a vis�o de que existia a oposi��o entre desenvolvimento econ�mico e prote��o ambiental, o que relegou a um plano secund�rio a quest�o ambiental.
Nessa �poca, abriu-se, ainda em plena ditadura, um espa�o pol�tico para o surgimento de um movimento ecol�gico pulverizado que atuava em torno de quest�es locais nas principais regi�es do pa�s. Tais movimentos, de acordo com Bressan Jr. [xiv], tiveram mais liberdade no contexto autorit�rio, por n�o terem, em suas ra�zes, vincula��o aparentemente direta com os demais movimentos pol�ticos da �poca, divididos entre direita e esquerda. Apesar disso, no mesmo per�odo, grandes projetos [xv] previstos pelos Planos Nacionais de Desenvolvimento (PNDs), baseados em forte endividamento externo, acabaram por destruir os principais ecossistemas brasileiros [xvi].
Em Agosto de1981, aLei federal 6.938 criou o Sistema Nacional de Meio Ambiente, integrado por um �rg�o colegiado: o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). Este colegiado � composto por representantes de minist�rios e entidades setoriais da Administra��o Federal, diretamente envolvidos com a quest�o ambiental, bem como de �rg�os ambientais estaduais e municipais, de entidades de classe e de organiza��es n�o-governamentais.� Essa Lei estabeleceu os objetivos, princ�pios, diretrizes, instrumentos, atribui��es e institui��es da pol�tica ambiental nacional. Segundo ela, o objetivo principal da pol�tica nacional de meio ambiente era: �a preserva��o ambiental prop�cia � vida, visando assegurar, no pa�s, condi��es para o desenvolvimento s�cio-econ�mico, os interesses da seguran�a nacional e a prote��o da dignidade da vida humana� [xvii]. Dentre os instrumentos por ela enumerados, encontramos: a avalia��o de impactos ambientais, o licenciamento e a revis�o de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras [xviii], procedimentos esses ratificados e assegurados na Constitui��o Federal de 1988 [xix].
Poucos anos depois da cria��o do Sisnama, o Presidente Jos� Sarney (1985-89) deu in�cio � redefini��o da pol�tica ambiental brasileira, atrav�s da reestrutura��o dos �rg�os p�blicos encarregados da quest�o ambiental. Atrav�s do programa Nossa Natureza, foram unificados o Sudepe (pesca), o Sudhevea (borracha), o IBDF (Desenvolvimento florestal) e a Sema (meio ambiente) em torno de um �nico �rg�o federal: o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (Ibama).
No cen�rio internacional, por sua vez, a partir da Conven��o de Viena (1985), uma nova �tica sobre a quest�o ambiental, agora preventiva, caracterizaria a d�cada de 1980. Seus principais objetivos eram o de proteger a sa�de humana e o meio ambiente contra os efeitos adversos possivelmente resultantes das atividades que modificavam a camada de oz�nio, tais como o aquecimento global, o derretimento das calotas polares e a prolifera��o de doen�as como o c�ncer de pele. De acordo com este novo enfoque, o mecanismo de Avalia��o de Impacto Ambiental (AIA) � instrumento t�pico de preven��o � tornou-se uma condi��o a ser cumprida para obten��o de concess�es para implanta��o de projetos possivelmente nocivos ao meio ambiente.
Essa medida teve seus reflexos no Brasil atrav�s da Constitui��o Federal de 1988 na qual se explicitava que a constru��o, instala��o, amplia��o e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadoras dos recursos ambientais, considerados efetivos ou potencialmente poluidores, dependeriam de pr�vio licenciamento por �rg�o estadual integrante do Sisnama sem preju�zo de outras licen�as exig�veis [xx].
O decreto 99.274 de 1990, que regulamentou a Lei 6938/81 e suas modifica��es posteriores, explicava o procedimento para o licenciamento ambiental [xxi], prescrevendo que o pr�vio licenciamento de atividades e obras utilizadoras dos recursos ambientais seria feito pelos devidos �rg�os estaduais competentes � incluindo o t�cnico e o pol�tico �, cabendo ao Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama) fixar os crit�rios b�sicos exigidos para os Estudos de Impacto Ambiental (EIA). Os Estudos de Impacto Ambiental e o Relat�rio de Impacto Ambiental (EIA/RIMA), em cada caso espec�fico, ficam a cargo do �rg�o concessor da licen�a atrav�s do chamado Termo de Refer�ncia. Tais estudos s�o conduzidos por profissionais habilitados, que respondem legalmente por seus atos, embora n�o haja um sistema de acredita��o e supervis�o da qualidade de seu trabalho.
Com o avan�o tecnol�gico da d�cada de 1980, o aperfei�oamento dos m�todos de diagn�stico dos problemas ambientais e o impulso observado pelo movimento ecol�gico, a quest�o central voltou-se para a sobreviv�ncia da esp�cie humana no planeta. Assim, o debate que havia se centrado basicamente nos impactos adversos que o meio ambiente sofria por causa do desenvolvimento deu origem a uma nova quest�o: quais seriam as perspectivas de desenvolvimento a partir de um meio ambiente degradado? Era preciso assim agir de forma respons�vel em rela��o ao meio ambiente, de modo a garantir os recursos naturais necess�rios � sobreviv�ncia das futuras gera��es.� Nascia a partir dessa id�ia o conceito de Desenvolvimento Sustent�vel.
A �tica preventiva da pol�tica ambiental dos anos 1980 cedia lugar a uma nova �tica, agora integradora que passava a combinar os aspectos econ�micos e sociais com os ambientais, em busca tanto da preserva��o do meio ambiente, como tamb�m de formas mais racionais de utiliza��o dos recursos naturais com vistas � preserva��o das gera��es futuras. A pauta da pol�tica ambiental internacional precisava, portanto, ser redefinida e o principal documento que representou esses esfor�os foi o Relat�rio Bruntland � mais conhecido como Nosso Futuro Comum � de 1987, atrav�s da iniciativa do Programa das Na��es Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA).
Participaram da confec��o desse documento foros setoriais que promoveram a discuss�o de problemas ambientais globais com a participa��o ativa de organiza��es n�o-governamentais internacionais. Novos temas de pol�tica ambiental foram assim redefinidos no mundo e a necessidade de um novo pacto entre as na��es geraria uma nova confer�ncia internacional, a Unced-92 (Conferencia das Na��es Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento), conhecida como Eco-92, realizada no Rio de Janeiro, Brasil.
A Eco-92 foi uma tentativa de reunir representantes de todos os pa�ses do mundo para discutir e divulgar a nova concep��o de Desenvolvimento Sustent�vel que estava em voga, a partir da publica��o do Relat�rio Brundtland. Esse evento significou para o Brasil ter que enfrentar a crise ambiental e ao mesmo tempo retomar o desenvolvimento, fortalecendo a democracia e a estabilidade da economia. O problema do desenvolvimento deveria ser finalmente resolvido sob uma �tica ambiental e socialmente sustent�vel.
O per�odo pr�-Eco-92 foi farto de medidas emergenciais com vistas ao atendimento da opini�o p�blica internacional. Entre elas, podemos citar: bombardeio dos campos de pouso dos garimpos, fechamento do po�o de testes nucleares constru�do na Serra do Cachimbo, demarca��o do territ�rio Ianom�mi, entre outros [xxii]. A prepara��o para a participa��o na Unced-92 atrav�s da elabora��o do relat�rio nacional para a defini��o das posi��es brasileiras pela Comiss�o Interministerial de Meio Ambiente (Cima), coordenada pelo Itamarati (Minist�rio das Rela��es Exteriores), foi um sinal significativo de que o tema meio ambiente se tornava mat�ria importante da pol�tica externa do pa�s. A Cima coordenou representantes de 23 �rg�os p�blicos para a elabora��o do relat�rio nacional com as posi��es do Brasil para a Unced-92. Foi criada a Secretaria do Meio Ambiente da Presid�ncia da Rep�blica, transformada mais tarde em Minist�rio do Meio Ambiente (MMA).
Como resultado das discuss�es do evento, o controle da polui��o industrial e da gest�o do ambiente urbano foi priorizado como uma quest�o de cidadania local, dos governos locais e do mercado de cr�dito e tecnologias. A �gua que bebemos, o ar que respiramos, a contamina��o dos alimentos que consumimos, o lixo e os res�duos que produzimos, as �reas verdes e de recrea��o e lazer ou o sil�ncio de que desfrutamos agora seriam problemas do mercado e da cidadania � a ser provida pelos governos locais [xxiii].
A Agenda XXI, principal documento resultante da Confer�ncia, apresentou um rol de programas que podem ser considerados instrumento fundamental para a elabora��o de pol�ticas p�blicas em todos os n�veis e que privilegiavam a iniciativa local. Nela, quest�es como Desenvolvimento Sustent�vel, Biodiversidade, Mudan�as Clim�ticas, �guas (doces e oceanos) e Res�duos (t�xicos e nucleares) tornavam-se problemas do planeta e da Humanidade e assumiam o novo centro da tem�tica ambiental, abordados em seus cap�tulos [xxiv]. A Agenda, no entanto, n�o teve a for�a de lei das conven��es e necessitava de cerca de 600 bilh�es de d�lares anuais para ser implantada no mundo. Al�m disso, sofreu com o denominador m�nimo provocado pelo consenso exigido nos encontros internacionais, o que tornou o texto muitas vezes vago, sem prazos, nem compromissos.
Ao longo dos anos 1990, o modelo de pol�tica ambiental executado no Brasil entrou em crise. Por um lado, por n�o atender � nova pauta da pol�tica internacional definida na Eco-92; por outro, por n�o atender �s demandas de cidadania e de consci�ncia ambiental que se generalizava. Isso fez com que se evidenciasse, finalmente, a necessidade de redefini��o das op��es de pol�tica ambiental e do pr�prio papel do Estado brasileiro. A cria��o do Ibama n�o consolidou um modelo institucional adaptado aos novos desafios. O pr�prio Minist�rio do Meio Ambiente, segundo Celso Bredariol, �sempre viveu uma grande defasagem entre pr�tica e proposta de pol�tica ambiental� [xxv]. Segundo o MMA, a sua proposta consiste em conceder �especial �nfase � inser��o da dimens�o ambiental nas decis�es de pol�ticas p�blicas� e � �introdu��o da vari�vel ambiental como crit�rio relevante nas decis�es de pol�tica econ�mica e de financiamentos de projetos pelas ag�ncias oficiais de desenvolvimento (...)� [xxvi].
Buscando a ado��o de uma pol�tica de co-responsabilidade e parceria atrav�s do di�logo, do convencimento e da conscientiza��o da sociedade para a pr�tica de uma gest�o otimizada de seus recursos naturais, o MMA procurou tamb�m transferir, total ou parcialmente, a Estados, Munic�pios, ONGs e outras entidades p�blicas e privadas, o planejamento e a execu��o de pol�ticas ambientais [xxvii]. No entanto, segundo Hageman [xxviii], o MMA quase n�o disp�e de outros recursos, a n�o ser os das ag�ncias multilaterais e, mesmo esses, de acordo com Freitas [xxix], s�o de dif�cil utiliza��o, tendo em vista fatores como a rigidez dos financiadores, a pouca participa��o da sociedade, a morosidade dos projetos e a necessidade de contrapartidas, entre outros.
Os �rg�os estaduais de meio ambiente, por sua vez, tiveram suas estruturas e bases legislativas ampliadas, embora esteja se verificando paulatinamente a perda de pessoal t�cnico, a degrada��o salarial e do atendimento ao p�blico, a crescente diminui��o de participa��o nos or�amentos estaduais e da centralidade dos respectivos pap�is na gest�o da pol�tica ambiental. O pr�prio Estado entrou em crise e, dentro da pol�tica de reformas e ajustes (Estado M�nimo), ele vem se debatendo entre propostas de privatiza��o, desregulamenta��o e press�es para a democratiza��o.
A Constitui��o de 1988 garante que o meio ambiente ecologicamente equilibrado � bem de uso comum do povo e cabe ao poder p�blico e � coletividade o dever de defend�-lo e preserv�-lo para as presentes e futuras gera��es. Exercendo a compet�ncia de defender o meio ambiente conforme prev� a Constitui��o de 1988, as prefeituras de grandes e m�dias cidades v�m procurando estruturar secretarias, departamentos e conselhos de meio ambiente que possam atender �s den�ncias e solicita��es da popula��o reclamante, assumindo, gradativamente, as atribui��es antes pertinentes aos �rg�os estaduais de meio ambiente ou ao Ibama.
Em 1998, foi aprovada a Lei de Crimes Ambientais no Brasil, uma das mais avan�adas do mundo. Condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente passaram a ser punidas civil, administrativa e criminalmente. A Lei n�o trata apenas de puni��es severas: ela incorpora m�todos e possibilidades de n�o aplica��o das penas, desde que o infrator recupere o dano ou, de outra forma, pague sua d�vida � sociedade. Esperou-se com esta Lei que �rg�os ambientais e Minist�rio P�blico pudessem contar com um instrumento a mais que lhes garantiria agilidade e efic�cia na puni��o dos infratores do meio ambiente.
Em 2002, foi realizada em Johannsburg, �frica do Sul, a Confer�ncia Ambiental Rio +10. Essa confer�ncia objetivou dar continuidade � discuss�o iniciada pela ECO-92. Adiscuss�o incidiu sobre a��es mais voltadas � erradica��o da pobreza, � globaliza��o e �s quest�es energ�ticas, tais como o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) e o Protocolo de Kyoto, bem como �s mudan�as clim�ticas, entre outros.� A Rio +10 reconheceu a import�ncia e a urg�ncia da ado��o de energias renov�veis em todo o Planeta e considerou leg�timo que os blocos regionais de pa�ses estabelecessem metas e prazos para cumpri-las. No entanto, n�o conseguiu fix�-las para todos os pa�ses, o que foi uma derrota, atenuada apenas pela decis�o de que o progresso na implementa��o de energias renov�veis seja revisto periodicamente pelas ag�ncias e institui��es especializadas das Na��es Unidas, o que abrir� assim caminhos para futuras negocia��es [xxx].
Os impactos da Conferencia Rio +10 na pol�tica ambiental brasileira e nas futuras decis�es dos pa�ses desenvolvidos em rela��o ao meio ambiente ainda s�o uma inc�gnita. Para alguns participantes, pouco se avan�ou em rela��o � Eco-92, realizada no Brasil h� dez anos. J� os grupos ligados aos governos acreditam ter havido progressos que devem ser comemorados. Representantes das Organiza��es das Na��es Unidas e funcion�rios governamentais ligados � quest�o ambiental que participaram do encontro lembram que, embora modestos, importantes avan�os foram conquistados: definiram-se compromissos com rela��o � amplia��o do saneamento b�sico no mundo e a redu��o do desmatamento; iniciou-se a restaura��o dos estoques pesqueiros, al�m de haver sido criado um novo sistema de gerenciamento de produtos qu�micos. Tamb�m houve progressos em rela��o ao combate � pobreza e, embora os Estados Unidos tenham mantido a decis�o de n�o assinar o Protocolo de Kyoto, R�ssia e Canad� garantiram sua ades�o ao documento que estabelece o controle da emiss�o de gases poluentes na atmosfera [xxxi].
Para as organiza��es n�o-governamentais e os ambientalistas, no entanto, a Confer�ncia foi um fracasso. Na analise de Frank Guggenheim, diretor-executivo do Greenpeace, a participa��o do Brasil na Rio + 10 foi marcada pela contradi��o: o pa�s calou-se sobre os novos projetos nacionais de hidrel�tricas e usinas nucleares, enquanto defendeu a meta mundial de 10% de energia proveniente de fontes renov�veis at� 2010 [xxxii].
Em conclus�o, a pol�tica ambiental brasileira propriamente dita se desenvolveu de forma tardia em rela��o �s demais pol�ticas setoriais do pa�s e em fun��o das press�es externas dos pa�ses desenvolvidos. A Lei de Crimes Ambientais, por exemplo, n�o chega a completar uma d�cada de exist�ncia.� Segundo Raquel Rigotto [xxxiii], se partirmos de uma vis�o s�cio-ambiental integradora das diferentes dimens�es da rela��o entre sociedade e natureza, devemos desenvolver uma compreens�o ampla das repercuss�es ambientais sobre a vida social, particularmente dos efeitos das transforma��es ambientais sobre a sa�de da popula��o em geral.
No entanto, n�o foi isso o que aconteceu no caso do Brasil desse �ltimo s�culo. A pol�tica ambiental brasileira n�o foi abordada, na pr�tica, sob uma �tica integrada �s demais �reas com ela relacionadas, como as de sa�de e de saneamento, por exemplo. Essas �reas, que foram alvo de pol�ticas setoriais pr�prias, exercem e sofrem impactos extremamente vis�veis sobre o meio ambiente. Para se ter uma id�ia, o lan�amento de esgoto a c�u aberto �, segundo o IBGE, hoje, a degrada��o ambiental mais freq�ente nas cidades brasileiras, o que gera, por conseq��ncia, um impacto negativo na sa�de coletiva, especialmente a infantil.
A pol�tica ambiental ideal seria aquela que incorporasse as diversas dimens�es da vida humana em sociedade, o que inclui as suas dimens�es sociais, ambientais, pol�ticas e econ�micas. O planejamento deve assim orientar-se em torno do princ�pio de sustentabilidade, entendido aqui como o principio que fornece as bases s�lidas para um estilo de desenvolvimento humano que preserve a qualidade de vida da esp�cie no planeta. A dimens�o ambiental deve, por isso, integrar de forma relevante a pol�tica de desenvolvimento das na��es em geral. A ado��o da perspectiva ambiental significa reconhecer que todos os processos de ajuste setorial e de crescimento est�o condicionados pelo entorno biof�sico local, nacional e global. Deve, portanto, ser combinada com outras perspectivas cr�ticas baseadas na preocupa��o com os direitos humanos, com os valores da autonomia nacional e da identidade cultural dos povos a que se referirem.
NOTAS:
[i] Magrini, Alessandra. Gest�o Ambiental. PPE/ COPPE/ UFRJ, 2001. (Apostila de Curso)
[ii] Goldemberg, Jos� et Barbosa, L.M. �A legisla��o ambiental no Brasil e em S�o Paulo� In: Revista Eco 21, Ano XIV, Edi��o 96, Novembro 2004.
[iii] Idem.
[iv] Bredariol, Celso. Conflito ambiental e negocia��o para uma pol�tica local de meio ambiente. Tese de doutorado. Rio de Janeiro: UFRJ; COPPE, 2001. p. 16
[v] Idem.
[vi] Meadows, D.H. et alli. Limites do Crescimento. S�o Paulo: Ed. Perspectiva, 1972
[vii] Meadows, D.H. et alli. Limites do Crescimento. S�o Paulo: Ed. Perspectiva, 1972.
[viii] Idem.
[ix] Ferreira, L. C. A Quest�o Ambiental: Sustentabilidade e Pol�ticas P�blicas no Brasil. S�o Paulo: Ed. Boitempo, 1998. p. 82
[x] Idem.
[xi] Carvalho, P. G. �Meio Ambiente e Pol�ticas P�blicas: A FEEMA diante da Polui��o Industrial�. In: P�dua, J. et al. (org.) Ecologia e Pol�tica no Brasil. Rio de janeiro: IUPERJ, 1987. p 206
[xii] Carvalho, P. G. �Meio Ambiente e Pol�ticas P�blicas: A FEEMA diante da Polui��o Industrial�. In: P�dua, J. et al. (org.) Ecologia e Pol�tica no Brasil. Rio de janeiro: IUPERJ, 1987. p 206
[xiii] Idem.
[xiv] Apud Celso Bredariol, Op.Cit. p. 18.
[xv] Exemplos de projetos: Grandes Caraj�s, Cerrados, Corredores de exporta��o, Coloniza��o, Programa 2010 da Eletrobr�s e Programa Nuclear, entre outros.
[xvi] Bredariol, C. Op.Cit. p. 19
[xvii] FEEMA, 1992. Apud Bredariol, C. Tese de Doutorado. Rio de Janeiro, 1999. p 18
[xviii] Lei federal 6.938/ 81, artigo 9, incisos III e IV.
[xix] CF 1988, artigo 225, � 1�, IV
[xx] Decreto 99.274/90, artigo 10
[xxi] Decreto 99.274/90, artigos17 a22.
[xxii] Bredariol, C. Op.Cit. p. 20
[xxiii] Idem.
[xxiv] Ibidem, p.21
[xxv] Bredariol, C. Op. Cit. p.31
[xxvi] Dispon�vel em. Acesso em Dezembro de 1999
[xxvii] Bredariol, C. Op. Cit. p.32
[xxviii] Apud Bredariol, C.Op. Cit. p.32
[xxix] Idem.
[xxx] Goldemberg, Jos� et Barbosa, L.M.� Op.Cit.�
[xxxi] American Chamber of Commerce forBrazil. �Os impactos da Rio+10 na pol�tica ambiental brasileira� . Dispon�vel em. Consultado em Janeiro de 2004.
[xxxii] Idem.
[xxxiii] Rigotto, Raquel. �Mecanismos Regulat�rios da Rela��o Ind�stria e Meio Ambiente�. In: Revista eletr�nica da Associa��o Brasileira para o Desenvolvimento de Lideran�as. Dispon�vel em:, publicado em 30/11/ 2002.
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