O Egito é uma dádiva do Nilo. (Heródoto)
Escrita pelo Historiador grego Heródoto há mais de 2.300 anos, a frase acima captura toda a essência da maior fonte de vida do Egito, o Nilo, que nasce no sul e vai para o norte até chegar ao mar Mediterrâneo (região conhecida com Delta do Nilo). O fato de ele ir do sul para o norte não quer dizer que o seu fluxo seja invertido, já que o movimento de um rio é sempre dado da região mais alta para a mais baixa. Em 2008 uma pesquisa apontou que o rio Nilo está em segundo lugar no quesito comprimento, perdendo apenas para o rio Amazonas.
Chamado pelos egípcios de Iteru, que em Hieróglifo significa “Rio”, o Nilo foi o principal fator para o desenvolvimento da sociedade egípcia. Sem ele, seria impossível qualquer tipo de evolução, já que lá o deserto é predominante. No passado o rio era mais largo e anualmente inundava todo o vale, o que não ocorre mais depois da construção da represa de Assuão, que gera energia e fornece água controlada para a irrigação.
Segundo BAINES; MALIK (2008, p. 15):
“As águas do Nilo provêm do Nilo Azul, que nasce nas terras altas da Etiópia, e do Nilo Branco, que se divide num emaranhado de regatos no Sudão meridional e se origina no lago Vitória, no centro da África […] No Egito a água do Nilo alcançava o nível mais baixo de abril a junho. Já em julho o nível subia e a inundação começava normalmente em agosto, cobrindo a maior parte do vale desde aproximadamente meados de agosto até o final de setembro, lavando os sais do chão e depositando um estrato de sedimentos que crescia a um ritmo de vários centímetros por século. Depois que o nível da água baixava, eram semeados os plantios principais em outubro e novembro, que, segundo a espécie, amadureciam de janeiro a abril.”
- Nilo visto do templo de Kom Ombo – Acervo pessoal.
- Nilo visto de uma embarcação (ao fundo: templo de Philae) – Acervo pessoal.
- Nilo visto do templo de Philae – Acervo pessoal.
O Nilo era responsável pela separação do mundo dos vivos (margem leste) e o dos mortos (margem oeste), e antes das modernas barragens ficarem prontas toda a sua água transbordava, proporcionando um solo fértil e de excelente qualidade para o plantio. Anualmente, na época da inundação (calendário), prevista com exatidão pelos egípcios, o Nilo depositava uma lama escura riquíssima em nutrientes, que deu origem ao antigo nome do Egito, Kemet, que em tradução livre significa “Terra Negra”. Além de proporcionar uma sistemática agricultura, o Nilo era uma grande “avenida” onde embarcações transitavam de ponta a ponta com muita facilidade.
Os habitantes do vale, preocupados com as enchentes, construíram ao longo do rio sistemas para medir o nível da água. Os Nilômetros eram poços feitos de pedra perto da margem e que tinham ligação direta com o rio. Com marcações nas paredes dessas estruturas, os egípcios conseguiam prever com certa tranquilidade a subida do Nilo.
Os antigos egípcios conheciam e admiravam tanto o Nilo que este era representado por um deus. Hapi era considerado o deus das águas do Nilo e para os egípcios ele foi o responsável por manter o controle e fornecer todo o alimento advindo do rio. Geralmente é representado segurando talos de Papiros e Flores de Lótus, que simbolizam respectivamente o Baixo e o Alto Egito. A cor de sua pele era azul ou verde, cores associadas à fertilidade, e em sua cintura carregava uma cinta utilizada por pescadores.
Salve, ó Nilo, que sais da terra e conservais vivo o Egito.
Para MILLARD (1975, p. 10):
“As palavras acima constituem a primeira linha de um hino a Hapi, o deus do Nilo. Fala das inúmeras dádivas feitas pelo deus a humanidade. Deve ter sido muito popular, pois existem diversos exemplares. Na sua maioria, foram escritos por crianças. Por vezes encontram-se erros de ortografia. Os peixes que viviam no Nilo e as aves que habitavam os canaviais ao longo das suas margens constituíam alimentos preciosos […] Os pescadores trabalhavam em grupos, com suas enormes redes, mas os nobres pescavam apenas por esporte, utilizando uma lança. Navegavam em pequenas e frágeis embarcações feitas de feixes de papiro atados. Cenas pintadas nos túmulos mostram-nos como os passarinheiros escondiam as redes entre canaviais, atraindo os pássaros imprudentes com iscas. Depois de terem atraído um número suficiente de pássaros, os homens puxavam as cordas e a rede encerrava as aves. Nem todas as criaturas de Hapi eram simpáticas ou úteis. Os crocodilos e os hipopótamos tornavam o rio perigoso.”
Apesar de ser o deus do Nilo e de os egípcios considerarem as suas águas sagradas, Hapi acabou ficando em segundo plano na religião egípcia, já que Osíris também era visto como responsável pelo rio. Sobek, o deus crocodilo, foi também associado ao Nilo.
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Autor: Lucas Ferreira
Fontes / Referências:
– BAINES, John; MALIK, Jaromir. Cultural Atlas of Ancient Egypt. London: Andromeda Oxford Limited, 2008.
– HART, George. The British Museum Pocket Dictionary of Ancient Egyptian Gods and Goddesses. British Museum Press, 2001.
– MILLARD, Anne. The Egyptians (Peoples of the past). London: MacDonald & Company, 1975.
– SHAW, Ian. The Oxford Illustrated History of Ancient Egypt. Oxford: Oxford University Press, 2000.
Sites / Referências:
– //www.reshafim.org.il/ad/egypt/
– //www.oxfordexpeditiontoegypt.com/
– //scriptorium.lib.duke.edu/papyrus/
– //www.globalegyptianmuseum.org/glossary.aspx?id=166
Natural de Criciúma – SC, Graduado e Pós-Graduado em História pela UNIASSELVI – SC, com ênfase no Antigo Egito. Apaixonado pelos antigos egípcios e desenvolvedor de projetos na área da Egiptologia.