Me reservo o direito de permanecer calado artigo

Na briga entre os que querem dizer tudo, “sem palpos na língua”, evocando o sagrado direito de liberdade de pensamento e de expressão e os que “se reservam o direito constitucional, concedido em Habeas Corpus, de permanecer em silêncio”, nem sempre há um espaço muito grande, sobretudo quando tratamos das mesmas pessoas.

Refiro-me a alguns depoentes que compareceram à CPI da Covid, que chega a seu quase final. Encerrada as oitivas, recolhidos os documentos, feitas as checagens devidas, passa-se ao Relatório, peça descritiva, apontando a autoria das infrações penais alvo das investigações.

O direito constitucional de ficar em silêncio e a palavra “narrativa” marcarão, sem dúvidas, a lembrança de todos. A primeira se escora na lei maior; a segunda, na teoria da linguagem, mais especificamente, na teoria do discurso.

O problema é que não haverá enunciação de culpas sem um discurso coerente e congruente sobre fatos e circunstâncias; os sujeitos e as suas falas; e as provas. O que significa dizer: desidratar a retórica jurídica e a retórica das “narrativas”, dando lugar aos dados documentais como provas da culpabilidade ou não, tudo dentro do método positivo de pensar o direito e os procedimentos parlamentares.

Poucos depoentes foram autênticos dentro da máxima de Friedrich Nietzsche: “Não te acovardes diante das tuas ações! Não as repudies depois de consumadas! – O remorso da consciência é indecente” (Crepúsculo dos Ídolos, p.14, Coleção Clássicos para Todos, da Nova Fronteira).

O direito de manter-se calado “pode ser entendido” como esse remorso da consciência. Mas os “sem palpos na língua” podem, também, construir narrativas enganosas ou assertivas. O espaço político é rico na criação de espaços discursivos. Tudo importa, tudo significa. O conjunto da obra é um outro discurso que se desdobra em outros, analíticos ou não, interpretativos ou não, mas a serviço de todos os propósitos, um metadiscurso.

Esta é a primeira CPI com transmissão quase que integral na TV por assinatura e na TV aberta do Senado da República, atingindo um grande público, fora do horário nobre, segregado em suas casas pela pandemia, pelo home office, pelo desemprego, ou mesmo mais atento ao noticiário político, não somente por causa da crise sanitária, econômica e social, mas, também, tocado pelos discursos radicalizados das redes sociais.

No formato televisivo “ao vivo”, com direito a downloads, a memes e outros recursos que a internet oferece, ampliou os espaços discursivos de que falamos acima. O discurso proferido pelo Senador Fabiano Contarato na presença do depoente Otávio Fakhoury, autor de mensagem homofóbica que circulou na internet, virou fenômeno midiático.

O fato do presidente Omar Aziz, simbolicamente, passar a presidência da Comissão ao senador ofendido para que o mesmo fizesse a sua fala como presidente interino, gerou outro discurso, gesto mais forte para uma minoria estigmatizada socialmente e os que a defendem.

Naquilo que diz respeito ao “fato determinado” de apuração, chama a atenção o apelo discursivo emocional, ou como querem alguns, “as narrativas”, por tratar-se de vidas humanas. Eles parecem humanizar ou aguçar a percepção fria dos dados, que evidenciam desvios de conduta na gestão pública e privada da saúde, atrocidades cometidas em nome de convicções ideológicas por pessoas, grupos ou instituições, revestidas ou não de poder discricionário. Embora caiba, ainda, apuração dos órgãos de justiça, tais fatos, se comprovados, têm o “marcador genético” que os aproxima daqueles que tiram o sono do mundo ao reaparecerem diante de nós.

Ficam muitas lições, mas destacamos: só o Estado Democrático de Direito e uma imprensa livre podem garantir essa viagem às entranhas do poder e da consciência dos indecentes.

Me reservo o direito de permanecer calado artigo
Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

O empresário Carlos Wizard afirmou à CPI da Pandemia que iria exercer seu direito de permanecer calado e que não responderia perguntas dos senadores do colegiado. Wizard obteve um habeas corpus junto ao Supremo Tribunal Federal, que garante seu direito ao silêncio.

“Ele vai permanecer calado em todas as perguntas como garante o habeas corpus”.
Alberto Toron, advogado de Carlos Wizard

O anúncio aconteceu ao final de sua fala inicial, na qual afirmou que desconhece a existência de um gabinete paralelo e que apenas se encontrou com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em eventos públicos.

“A minha disposição em servir ao país combatendo a pandemia e querendo salvar vida faz com que eu seja acusado de pertencer a um suposto gabinete paralelo. Eu afirmo aos senhores com toda veemência que desconheço qualquer governo paralelo. Se por ventura, gabinete paralelo existiu, eu jamais tomei conhecimento ou tenho qualquer informação a esse respeito. Jamais participei de uma única sessão em privado, reunião em privado, com o presidente da República. Participei de eventos em que estava presente ele e centenas de outros convidados”.
Carlos Wizard

CPI vai recorrer da decisão do STF

O presidente da CPI da Pandemia, Omar Aziz (PSD-AM), anunciou durante a sessão desta quarta-feira (30) que vai recorrer da decisão do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que permitiu ao bilionário Carlos Wizard o direito de permanecer calado em seu depoimento.

“Essa forma como o senhor fala, machuca muito as pessoas que perderam pessoas. Machuca demais. Eu peço à mesa que recorra da decisão do ministro Barroso em relação ao Habeas Corpus que concedeu à vossa excelência o direito de vir aqui e ler uma única frase. Podemos recorrer fazendo um apelo ao ministro, ao Supremo, para que possamos dar, como essa fala do senhor, de exemplo que isso não pode ficar impune. Não pode ficar impune em nome de 516 mil vidas”.
Omar Aziz

‘Só bandido se usa do direito de ficar calado na CPI’

Ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Onyx Lorenzoni já criticou em outra oportunidade depoentes que permanecem em silêncio em CPIs.

Onyx escreveu no Twitter em 11 de maio de 2015, quando participou de sessão de questionamentos ao ex-presidente da Petrobras, Nestor Cerveró, na CPI da Petrobras, que investigava um esquema de corrupção na empresa, que somente “bandido” se utiliza do direito de ficar calado.

“Cerveró ouviu de mim que em CPI, quem se vale do direito ‘ficar calado’ tem coisa a esconder. Só bandido usa disso”.
Onyx Lorenzoni

Wizard, na verdade, é Carlos Martins

A escola de inglês Wizard soltou um comunicado na manhã desta quarta-feira (30) afirmando que o seu posicionamento sobre a pandemia e medidas sanitárias é “muito diferente de Carlos Martins” e reforçou que o empresário não tem mais vínculo com a instituição.

“Desde 2014, a Wizard by Pearson faz parte da maior empresa de aprendizagem do mundo, a Pearson. Naquele ano, a multinacional britânica adquiriu a totalidade dos direitos e do controle sobre a marca, passando a ser sua única proprietária e encerrando por completo qualquer vínculo entre a rede de escolas de idiomas e o seu ex-dono, o empresário Carlos Martins”, diz o comunicado.

O comunicado também explica por que manteve o “Wizard” em seu nome. “Um fato curioso é que, apesar de continuar usando a palavra “Wizard” em seu nome, hoje o empresário Carlos Martins é concorrente da marca. Em 2017, três anos depois de vender a Wizard para a Pearson, ele tornou-se sócio de outra rede de escolas de inglês, a Wise Up, inclusive, por vezes, passando a associar o seu nome a nova rede de escolas da qual é sócio atualmente”.

Em outro momento, a direção da instituição de ensino afirma que é a “favor da vida, da saúde e da ciência”.

CPI convoca Ricardo Barros

A CPI da Covid aprovou nesta quarta-feira (30) a convocação do líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), e do agora ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde, Roberto Dias. Ao todo, foram aprovadas as convocações de 21 pessoas. Servidores do Ministério da Saúde e empresários do ramo farmacêutico também foram atingidos.

Com a medida, os senadores buscam avançar sobre o que chamam de uma nova fase de investigação. A cúpula da CPI avalia que há indícios de “desvio de dinheiro público no âmbito da administração federal”, nas palavras do relator Renan Calheiros (MDB-AL).

A convocação do líder do governo Jair Bolsonaro na Câmara ocorre após depoimento dos irmãos Miranda à CPI. Segundo eles, houve pressão pela liberação da vacina indiana Covaxin, embora a área técnica do Ministério da Saúde tenha constatado irregularidades no contrato.

Marcos Rogério abre mão de defender governo Bolsonaro

O senador Marcos Rogério (DEM-RO) abriu mão de defender o governo Jair Bolsonaro, que enfrenta cada vez mais denúncias de corrupção envolvendo a tentativa de importação da vacina indiana Covaxin.

“Na administração pública nenhum contrato deve ser firmado às pressas. Vamos investigar tudo. Não blindo quem rouba dinheiro público. Defendo investigar tudo, seja no Ministério da Saúde, seja no Consórcio Nordeste. Não tenho bandido preferido”. 
Marcos Rogério

Leia também: Acompanhe a entrega do ‘Superpedido de Impeachmet’ de Bolsonaro

Na sessão, o senador também criticou os senadores oposicionistas ou independentes, que somam sete dos 11 titulares da CPI da Pandemia.

“Senadores sempre defenderam uma postura irresponsável com os negócios públicos. Os atos administrativos são complexos e devem ser praticados com o rigor necessário”.
Marcos Rogério

Com informações do G1, Revista Fórum e Brasil 247

Que se reserva o direito de permanecer calado?

O direito de ficar calado está previsto no inciso LXIII do artigo 5o da Constituição Federal de 1988. Esse inciso define que, quando um indivíduo é preso, ele deve ser informado dos seus direitos, incluindo o Direito ao Silêncio.

Como funciona o direito ao silêncio?

O direito ao silêncio é um direito fundamental do réu, esculpido na Constituição Federal e acolhida no Brasil em 1992 na Convenção Americana de Direitos Humanos Pacto de San José da Costa Rica, de 1969, ou seja, o direito de não participar, de qualquer modo, na acusação estatal contra si mesmo.

Quais são os 5 direitos protegidos pelo princípio da vedação a autoincriminação?

No Brasil, de forma sistematizada, pode-se estruturar o princípio da vedação à autoincriminação em três direitos principais: o direito de não conformar-se com a acusação; o direito de não depor contra si; e o direito de não contribuir para a produção de outras provas (DEL PONTE, 2011).

Qual o momento em que o réu pode fazer uso do silêncio?

STJ: no interrogatório, o réu pode ficar em silêncio e responder apenas às perguntas da defesa. A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o interrogatório é ato de defesa e, com isso, o réu pode ficar em silêncio e responder apenas às perguntas da defesa.