Não é considerado parte do território brasileiro para efeitos penais?

De acordo com Masson: “O Código Penal brasileiro limita o campo de validade da lei penal com observância de dois vetores fundamentais: a territorialidade (art. 5.º) e a extraterritorialidade (art. 7.º). Com base neles se estabelecem princípios que buscam solucionar os conflitos de leis penais no espaço”.

Territorialidade:

Dispõe o artigo 5º: “Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional”. Traduz o principio da Territorialidade, adotado no Brasil como regra.

De acordo com Masson: “território é o espaço em que o Estado exerce sua soberania política”. O mesmo autor aponta o que seria este território:

a)o espaço territorial delimitado pelas fronteiras, sem solução de continuidade, inclusive rios, lagos, mares interiores e ilhas, bem como o respectivo subsolo;

b)o mar territorial, ou marginal, que corre ao longo da costa como parte integrante do território brasileiro e que tem uma faixa de doze milhas marítimas de largura, medidas a partir da baixa-mar do litoral continental e insular brasileiro, na forma definida pela Lei 8.617/1993. A soberania brasileira alcança também o leito e o subsolo do mar territorial.

c)a plataforma continental, medindo 200 milhas marítimas a partir do litoral brasileiro (ou 188 milhas, deduzidas as 12 milhas do mar territorial), como zona econômica exclusiva, instituída pela Lei 8.617/1993, que incorporou a Convenção da ONU de 1982, sobre o direito do mar;

d)o espaço aéreo, compreendido como a dimensão estatal da altitude. Em relação ao domínio aéreo, adotou-se a teoria da absoluta soberania do país subjacente, pela qual o Brasil exerce completa e exclusiva soberania sobre o espaço aéreo acima de seu território e mar territorial (art. 11 da Lei 7.565/1986);

(…)

g)os rios e lagos internacionais, que são aqueles que atravessam mais de um Estado. Se forem sucessivos, ou seja, passarem por dois ou mais países, mas sem separá-los, considera-se o trecho que atravessa o Brasil. Caso sejam simultâneos ou fronteiriços, isto é, separarem os territórios de dois ou mais países, a delimitação da parte pertencente ao Brasil é fixada por tratados ou convenções internacionais entre os Estados interessados.

Entende-se por território nacional: Espaço geográfico (delineado anteriormente) + espaço jurídico. Este é composto pelas embarcações ou aeronaves privadas em alto-mar são consideradas extensões do território brasileiro e embarcações ou aeronaves privadas estrangeiras em pouso ou porto brasileiro.

É a previsão do artigo 5º, §§1º e 2º do Código Penal:

§ 1º – Para os efeitos penais, consideram-se como extensão do território nacional as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem, bem como as aeronaves e as embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto-mar.

§ 2º – É também aplicável a lei brasileira aos crimes praticados a bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de propriedade privada, achando-se aquelas em pouso no território nacional ou em vôo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar territorial do Brasil

Principio da Passagem Inocente: Não se aplica a lei brasileira em caso de crime cometido a bordo de embarcação, ainda que em espaço/mar territorial nacional, quando esta estava apenas de passagem necessária para outro país. Também abrange aeronaves, embora não haja previsão expressa. Artigo 3º da Lei 8.617/93. Porém, se o crime de alguma forma afetar o interesse nacional será aplicado a lei brasileira.

O principio da territorialidade não soluciona todos os problemas. Muitas vezes, o delito é cometido por brasileiro no exterior ou, então, por estrangeiro no Brasil, por este motivo o Código Penal adotou como regra geral o princípio da territorialidade de forma temperada ou mitigada.

É necessário analisar outros princípios como:

1) Nacionalidade/ Personalidade ativa: Aplica-se a lei penal da nacionalidade do sujeito ativo, previsto no art. 7.º, I, alínea “d” (“quando o agente for brasileiro”), e também pelo inciso II, alínea “b”, do Código Penal.

2) Nacionalidade/ Personalidade passiva: a vítima é brasileira. O autor do delito que se encontrar em território brasileiro, embora seja estrangeiro, deverá ser julgado de acordo com a nossa lei penal. É adotado pelo art. 7.º, § 3.º, do Código Penal.

3) Defesa (ou real): Leva-se em consideração a nacionalidade do bem jurídico atingido. Previsto no art. 7.º, I, alíneas “a”, “b” e “c”, do Código Penal, compreendendo os crimes contra:

a)a vida ou a liberdade do Presidente da República;

b)o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado, de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público; e

c)a administração pública, por quem está a seu serviço.

4) Justiça penal universal: aplica-se a lei do local em que o agente for encontrado, todos os Estados da comunidade internacional podem punir os autores de determinados crimes que se encontrem em seu território, de acordo com as convenções ou tratados internacionais, pouco importando a nacionalidade do agente, o local do crime ou o bem jurídico atingido. Vide art. 7.º, II, “a”, do Código Penal: “os crimes que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir”.

5) Representação, pavilhão, subsidiário ou da substituição: Utilizado quando o crime for praticado em aeronaves e embarcações privadas e o país em que foi praticado o crime demonstrar desinteresse em puni-lo. art. 7.º, II, “c”, do Código Penal.

Masson, traz a seguinte pergunta: E se a aeronave ou embarcação brasileira for pública ou estiver a serviço do governo brasileiro?

Resposta: Essa questão, simples, mas capciosa, já foi formulada em diversos concursos federais. Não incide no caso o princípio da representação, mas sim o da territorialidade. Lembre-se: aeronaves e embarcações brasileiras, públicas ou a serviço do governo brasileiro, constituem extensão do território nacional (art. 5.º, § 1.º, do Código Penal).

Assim, há casos em que a lei penal brasileira é aplicada aos crimes cometidos no exterior (extraterritorialidade). Há também casos em que a lei penal estrangeira é aplicada aos crimes cometidos no Brasil (intraterritorialidade).

Extraterritorialidade pode ser:

A) Incondicionada: Aplica-se a lei brasileira, ainda que os crimes tenham sido cometidos no estrangeiro, sem exigir qualquer condição (art. 7º, §1º, CP).

Art. 7º (…)

I – os crimes:

a) contra a vida ou a liberdade do Presidente da República; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 1984)

b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado, de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 1984)

c) contra a administração pública, por quem está a seu serviço; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 1984)

d) de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil;

(…)

§ 1º – Nos casos do inciso I, o agente é punido segundo a lei brasileira, ainda que absolvido ou condenado no estrange.

Porém, de acordo com o artigo 8º no caso de extraterritorialidade incondicionada, a pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas, ou nela é computada, quando idênticas, forma de atenuar a dupla punição.

Art. 8º  do CP: “A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas, ou nela é computada, quando idênticas”.

O art. 2.º da Lei 9.455/1997 apresenta ouro exemplo:“O disposto nesta Lei aplica-se ainda quando o crime não tenha sido cometido em território nacional, sendo a vítima brasileira ou encontrando-se o agente em local sob jurisdição brasileira”.

B) Condicionada: depende do preenchimento dos de todos os requisitos presentes no art. 7º, § 2º, do CP.

Masson: “lei penal brasileira é subsidiária em relação aos crimes praticados fora do território nacional”

Art. 7º (…)

II – os crimes:

a) que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir;

b) praticados por brasileiro; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 1984)

c) praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, quando em território estrangeiro e aí não sejam julgados.

§ 2º – Nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do concurso das seguintes condições:

a) entrar o agente no território nacional;

b) ser o fato punível também no país em que foi praticado;

c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição;

d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena;

e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável.

Verifica-se ainda uma outra situação que alguns doutrinadores chamam de hipercondicionada, quando ocorre no caso de crime cometido por estrangeiro contra brasileiro, fora do Brasil, exigindo-se outras duas condições, além das anteriormente indicadas, quais sejam:

a)não ter sido pedida ou ter sido negada a extradição; e

b)ter havido requisição do Ministro da Justiça.

LOCAL DO CRIME

De forma similar ao que foi estudado quando tratamos da lei penal no tempo, existem três teorias sobre a aplicação da norma:

a) atividade: considera-se local do delito aquele onde foi praticada a conduta (atos executórios);

b) resultado: o lugar do crime é aquele onde ocorreu o resultado (consumação);

c) mista ou da ubiquidade: é lugar do crime tanto onde houve a conduta quanto o local onde se deu o resultado. Esta é a teoria adotada pelo Código Penal de acordo com o artigo 6º: Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado.

Para se aplicar a lei penal brasileira basta que um único ato executório, dos diversos realizados pela conduta criminosa, toque em nosso território ou, então, que o resultado aqui se verifique. Ex: Se da margem do Rio Paraguai, lado deste país, uma pessoa atira em um Brasileiro que está na margem do lado do nosso território, o Brasil dispõe de legitimidade para o julgamento do crime, porquanto uma parcela dos atos executórios realizou-se em nosso país, se fosse ao contrário o Brasil também teria legitimidade. Considera-se o crime praticado nos dois países.

LEI PENAL EM RELAÇÃO AS PESSOAS

A) Agentes diplomáticos

 Princípio da territorialidade, adotado pelo Brasil, não é absoluto e a parte final do artigo 5º do Código penal autoriza a criação das imunidades diplomáticas e de chefes de governos estrangeiros. Cabe ressaltar que seus funcionários particulares não possuem a imunidade.

A Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, incorporada ao direito pátrio pelo Decreto 56.435/1965, assegura ao diplomata, embaixadores, secretários da embaixada, pessoal técnico e administrativo das representações, seus familiares, funcionários da ONU, OEA e demais organizações internacionais quando em serviço, o Chefe de Estado estrangeiro que visita o país, e inclusive, os membros da sua comitiva, a respectiva imunidade que não permite sua prisão nem a submição a qualquer procedimento sem autorização de seu país.

A imunidade é irrenunciável por parte do seu destinatário, podendo apenas o Estado a que representa fazer a renúncia.

As sedes das embaixadas não são extensões de territórios estrangeiros no Brasil, porém, não podendo ser objeto de busca, requisição, embargo ou medida de execução  as autoridades nacionais não podem adentrar nas sedes diplomáticas sem autorização, salvo se o crime tenha sido praticado em seu interior por alguém que não faça parte do corpo diplomático.

A1) Cônsules

Masson:  “Os cônsules, por seu turno, são funcionários públicos de carreira ou honorários e indicados para a realização de determinadas funções em outros países, com imunidades e privilégios inferiores aos dos diplomatas. A imunidade penal é limitada aos atos de ofício, podendo ser processados e condenados por outros crimes”.

B) Parlamentares

De acordo com Nucci: São espécies de imunidades parlamentares: a) substantiva (material, absoluta, real ou irresponsabilidade legal), que é um privilégio de direito penal substantivo e visa a assegurar a liberdade de palavra e de debates; b) processual (formal ou relativa), que é um privilégio de natureza processual e tem por fim garantir a inviolabilidade pessoal, evitando que o parlamentar seja submetido a processos tendenciosos ou prisões arbitrárias.

A imunidade substantiva/ material está prevista no art. 53, caput da Constituição Federal: “os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”.

Por outro lado a imunidade processual/ formal está prevista no o art. 53, § 2.º, da CF: “desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão”.

Referências bibliográficas

BITTENCOURT, Cezar Roberto, Tratado de Direito Penal. 22ª Ed. Saraiva, 2016

CAPEZ, Fernando, Curso de Direito Penal. 10ª ed.Volume 1, Editora Saraiva,2006.

CUNHA, Rogério Sanches. Manual de direito penal: parte geral (arts. 1º ao 120). Salvador, JusPODIVM, 2016.

GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte geral, volume I – 19. ed. – Niterói, RJ: Impetus, 2017.

MASSON, Cleber. Código Penal comentado I. 4. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2016.

NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de direito penal : parte geral: arts. 1º a 120 do Código Penal– Rio de Janeiro: Forense, 2017.

O que compreende o território nacional para efeitos penais?

Entende-se por território nacional a soma do espaço físico (ou geográfico) com o espaço jurídico (espaço físico por ficção, por equiparação, por extensão ou território flutuante).

O que faz parte do território nacional?

Juridicamente, território nacional é a área que compreende todo o espaço, terrestre, fluvial, marítimo (12 milhas) e aéreo (coluna atmosférica), onde o Estado brasileiro é soberano.

Qual a regra de territorialidade aplicada pelo direito penal?

A Territorialidade dispõe que a lei penal brasileira será aplicada sempre que um crime for cometido dentro do território nacional. Assim, em regra, caso alguém cometa um homicídio dentro do Brasil, essa pessoa será julgada pelas leis brasileiras.

O que é territorialidade incondicionada?

A territorialidade incondicionada encontrada no artigo 7º, inciso I do Código penal, são as hipóteses em que independem de qualquer ocorrido no território estrangeiro, as três primeiras causas vem em decorrência do princípio da proteção (ou defesa) onde o que é lesionado além do bem jurídico do crime, um bem jurídico ...