Que papel Clístenes desempenhou ao estabelecer a democracia em Atenas

Se a democracia tivesse fundadores, Efialtes seria – juntamente com Clístenes, Péricles, Aspásia, Protágoras e outros sofistas – um de seus “pais fundadores”

A famosa reforma de Clístenes, em 509-508 a.C., que dá origem à democracia ao substituir o poder do ‘genos’ (as famílias da aristocracia fundiária) pelo poder do ‘demos’ (distrito, circunscrição sócio-territorial onde deveria se conformar uma koinonia – comunidade – política) não pegou de uma vez.

Claude Mossé (1971) conta que essas reformas, “estabelecendo a isonomia, criaram novas estruturas, [mas] nem por isso modificaram substancialmente as condições da vida política. Os chefes das grandes famílias aristocráticas, ao se elegerem estrategos, conservavam de fato a direção da vida política e…. todos os dirigentes de Atenas, entre 508 e 462 a.C., pertenciam a essa camada social” (1).

A continuidade das reuniões da Ekklésia (assembleia) – da qual participava a população urbana e do porto, que não estava ligada à aristocracia rural -, foi modificando a situação. Apareceram então novos atores políticos, como Efialtes.

Mossé escreve que “Efialtes foi, talvez, um dos que, em 462-1 a.C., propôs a aprovação de uma lei privando o Areópago da maior parte de suas prerrogativas judiciárias, doravante atribuídas à Boulé dos Quinhentos e ao tribunal da Heliéia. Era o derradeiro golpe desfechado no velho conselho aristocrático que, por certo, sofrera transformações, no recrutamento de seus membros, a partir do momento em que o arcontado passou a ser não mais uma função elegível, mas provida por sorteio…” (2)

Aqui há duas pistas importantes (para as quais ela – Claude Mossé – não chamou a atenção):

1) Efialtes era um ‘qualquer um’, homem sem posses que, quase meio século (46 anos) depois da reforma de Clístenes, propôs a reforma decisiva que possibilitaria o funcionamento do regime democrático mais plenamente (a sua “idade de ouro”, com o protagonismo de Péricles, entre 461 – data do assassinato misterioso de Efialtes – até o início da Guerra do Peloponeso: foi a época em que floresceram os sofistas, em especial Protágoras, que participava do círculo de Péricles e Aspásia).

2) O sorteio, que impedia a articulação de forças oligárquicas para, por meio da eleição, manter posições de poder. (Pulando várias passagens: eis a primeira indicação de que eleições podem ser usadas contra a democracia).

Sim, sem o sorteio não teria se inventado a democracia. Se o arcontado continuasse sendo uma função elegível, os oligarcas teriam se articulado para continuar vencendo as eleições e indicando seus representantes no Areópago. Quem bagunçou tudo isso foi a introdução do sorteio. A democracia tem muito mais a ver com sorteio e muito menos a ver com eleições do que se imagina. Aliás, foi, em parte, usando as eleições contra a democracia nascente que a aristocracia fundiária permaneceu no poder durante quase meio século depois da reforma de Clístenes.

Jacques Rancière (2005) em O ódio à democracia, resume muito bem o papel central do sorteio na democracia:

“A democracia não é um tipo de constituição nem uma forma de sociedade. O poder do povo não é o da população reunida, de sua maioria ou das classes laboriosas. É simplesmente o poder próprio daqueles que não têm mais título para governar do que para ser governados. E não podemos nos livrar desse poder denunciando a tirania das maiorias, a estupidez dos animais ou a frivolidade dos indivíduos consumidores. Porque então seria necessário nos livrarmos da própria política. Esta só existe se houver um título suplementar aos que funcionam habitualmente nas relações sociais. O escândalo da democracia, e do sorteio que constitui sua essência, é revelar que esse título só pode ser a ausência de título, o governo das sociedades só pode repousar, em última instância, em sua própria contingência. Há pessoas que governam porque são as mais velhas, as mais bem-nascidas, as mais ricas ou as mais sábias. Há modelos de governo e práticas de autoridade baseados em tal ou tal distribuição de lugares e competências… Mas se o poder dos mais velhos deve ser mais do que uma gerontocracia e o poder dos ricos mais do que uma plutocracia, se os ignorantes devem compreender que eles devem obedecer às ordens dos sábios, seu poder deve repousar sobre um título suplementar, o poder dos que não têm nenhuma propriedade que os predisponha mais a governar do que a ser governados. Ele deve se tornar um poder político. E um poder político significa, em última instância, o poder dos que não têm razão natural para governar sobre os que não tem razão natural para ser governados. Em última análise, o poder dos melhores só pode se legitimar pelo poder dos iguais” (3).

A democracia, como se sabe, não tem fundadores. Clístenes não fazia a menor ideia de como esse tipo radical e surpreendentemente inovador de regime (a democracia) poderia funcionar. O mesmo vale para Efialtes, com a diferença de que este último já representava o que seria a democracia, não como governo de todos, de muitos, de poucos ou de um, mas como o governo de qualquer um (o que, no limite, não é governo) (4).

Notas

(1) MOSSÉ, Claude (1971). Atenas: a história de uma democracia. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1982.

(2) Idem.

(3) RANCIÈRE, Jaques (1985). O ódio à democracia. São Paulo: Boitempo, 2014.

(4) SANTOS, Nuno Cunha (2009). Por que razão foi assassinado Efialtes. Recanto das Letras, 2009. Disponível em: <https://www.recantodasletras.com.br/trabalhos-academicos-de-historia/1459105> Ver nota abaixo.


Há muito pouca informação disponível sobre Efialtes. Vale a pena ler a nota abaixo, de Nuno Cunha dos Santos (2009):

POR QUE RAZÃO FOI ASSASSINADO EFIALTES?

Apesar do papel importante que desempenhou na construção da democracia ateniense, Efialtes é uma personagem acerca da qual pouco conhecemos. Relativamente às suas origens, apenas sabemos que era filho de Sofónides. Aristóteles, referindo-se à sua personalidade, sublinha, na Constituição dos Atenienses, a sua incorruptibilidade e o seu respeito pela constituição. Quanto à sua carreira política, sabemos, através de Plutarco, que liderou, conjuntamente com Péricles, a facção democrática em Atenas no final da primeira metade do século V a.C. Ainda segundo Aristóteles, sabemos que foi o responsável pela reforma do Areópago, órgão controlado pela aristocracia e tendencialmente conservador, limitando o seu poder ao julgamento de casos de homicídio e crimes religiosos. Esta reforma terá ocorrido em 462 a.C. e não terá sido bem recebida entre a aristocracia, tendo, inclusivamente, segundo Aristóteles, na Constituição dos Atenienses, levado a que, em 461 a.C., Efialtes fosse morto à traição por Aristódico de Tanagra. No entanto, relativamente à questão da identidade do seu assassino, convém salientar que Aristóteles viveu no século IV a.C. e que durante o século V a.C. nunca se conseguiu descobrir quem teria levado a cabo o assassinato em questão.

Feita a apresentação de Efialtes, importa agora definir o objetivo principal deste trabalho, que é tentar responder à seguinte questão: Por que razão foi assassinado Efialtes?

Para atingir o objetivo deste trabalho, importa, antes de mais, compreender de que forma é que a democracia ateniense se foi construindo e, não menos importante, tentar perceber qual foi o impacto que a reforma de Efialtes teve na Atenas da sua época. Escolho este caminho por ser da opinião que a reforma levada a cabo por Efialtes foi um produto da história de Atenas e que só através da compreensão do referido processo de construção da democracia, bem como do impacto que a reforma em questão teve, é que poderemos lançar alguma luz sobre as razões que poderão ter estado por trás deste assassinato.

Atenas sempre foi uma polis em conflito, marcada pela luta entre classes, sobretudo entre as famílias aristocráticas, que se gladiavam entre si pelo poder na cidade. Esta será uma característica desta polis ao longo dos tempos e que se manterá ainda na Atenas do século V a.C., onde Efialtes viveu. É na sequência destes conflitos internos que no século VII a.C. é chamado o legislador Drácon, responsável pelas primeiras leis em Atenas, que, segundo Aristóteles, na Constituição dos Atenienses, não terão resolvido os problemas existentes. Acerca destas leis pouco se conhece, mas, não obstante o fato de não terem solucionado os referidos conflitos, a sua existência é de suma importância, porque, por um lado, reconhecem a necessidade de existirem leis para solucionar os conflitos existentes e, por outro lado, representam um momento de institucionalização da polis.

Tal como é referido no parágrafo anterior, segundo Aristóteles, na Constituição dos Atenienses, as leis de Drácon não tiveram o impacto pretendido e não conseguiram resolver os conflitos na polis. Atenas continuava a ser uma cidade em constante conflito interno, regida por uma constituição oligárquica, onde, por um lado, os conflitos entre as facções aristocráticas se mantinha e, por outro lado, onde muitos haviam sido feitos escravos e em alguns casos vendidos na sequência dessa condição, devido ao não pagamento de empréstimos contraídos junto dos Eupátridas, cujo penhor era a liberdade do próprio endividado e da sua família. É neste cenário que no começo do século VI a.C. é chamado o legislador Sólon, descrito por Aristóteles, na Constituição dos Atenienses, como “o primeiro campeão do povo”. Embora as fontes sejam contraditórias em relação às suas reformas, Sólon terá: abolido a escravidão de cidadãos atenienses por motivo de dívidas, criado duas novas instituições (1) – a Boulê (2) e a Helieia (3) e dividido a população em quatro classes censitárias, sujeitando o assento nos cargos ao rendimento dos cidadão, ao contrário do que acontecia até então, onde o assento nos referidos cargos estava sujeito ao nascimento nobre (4).

No entanto, as reformas de Sólon não surtiram o efeito esperado e Atenas continua a ser uma polis em conflito constante. Menos de dez anos volvidos, as lutas entre facções tinham se acentuado novamente, sendo neste contexto que Pisístrato aproveita para instaurar a tirania, regime que, após uma primeira tentativa falhada em 561 a.C., impõe definitivamente em 546 a.C. e que se mantém até 510 a.C.

No entanto, esta tirania acaba por ser um passo em frente na construção da democracia ateniense, porque, ao manter as leis e instituições criadas por Sólon, contribui para um período de maior estabilidade, permitindo aos atenienses uma melhor adaptação às referidas leis, bem como ao funcionamento das instituições.

Após a queda da tirania em 510 a.C., retornam os conflitos entre as facções aristocráticas, tendo como protagonistas Iságoras e Clístenes. Em 508 a.C. Iságoras acaba por conseguir ser eleito Arconte e, aproveitando a amizade que tem com o rei espartano Cleómenes, consegue expulsar Clístenes da cidade, com o intuito de estabelecer em Atenas um regime oligárquico. No entanto, Iságoras depara-se com a resistência do dêmos, que se opõe à sua tentativa, e com a retirada dos espartanos. Entretanto, Clístenes é chamado de volta e em 508/507 a.C. assume o poder, procedendo de seguida a uma série de reformas que serão fundamentais para o processo de construção da democracia ateniense. Assim, Clístenes irá procurar, por um lado, reorganizar o corpo cívico da cidade e, por outro lado, modificar as instituições políticas existentes. Nesse sentido, com o objetivo de diluir as solidariedades locais em torno das três principais famílias aristocráticas em Atenas (Alcmeónidas, Filaidas e Pisistrátidas) e evitar que estas tivessem garantida a eleição para o Arcontado, resolve proceder a uma série de reformas, de entre as quais são de destacar: o alargamento do corpo de cidadãos, através da concessão de cidadania a não atenienses, aumentando desta forma o número de cidadãos; a criação do demo como nova divisão administrativa do território; a divisão da Ática em três zonas – a urbana ou cidade e arredores, a costeira e a interior – e procede à repartição do demo em trinta grupos (as trítias), dez por cada uma das três zonas referidas. Com essas trítias, agrupando uma de cada zona, procede à criação de dez tribos, passando cada tribo a eleger cinquenta representantes para a Boulê, que passa assim de quatrocentos para quinhentos membros, e seiscentos representantes para a Helieia.

Com estas medidas, embora mantendo as reformas de Sólon, Clístenes ganha grande popularidade, porque, por um lado, com o alargamento do corpo de cidadãos, consegue criar condições para uma maior participação do dêmos na polis e, por outro lado, com a divisão da população em dez tribos compostas por pessoas de três regiões diferentes da Ática, consegue, em certa medida, diluir as solidariedades locais em torno das principais famílias aristocráticas.

Chegado a este ponto, importa agora, antes de avançar mais, compreender algumas ideias que considero importantes para o entendimento do impacto da reforma levada acabo por Efialtes, bem como dos motivos que poderão ter levado ao seu assassinato. Como podemos ver através do que até agora foi dito, Atenas é uma polis em conflito constante, onde existe uma grande luta entre as famílias aristocráticas pelo poder na cidade. É na sequência dessas lutas que vão surgindo as reformas políticas em Atenas e que o dêmos vai ganhando cada vez mais poder. Assim, é neste contexto que irá surgir a reforma de Efialtes, que, em minha opinião, não obstante o seu impacto, foi uma consequência lógica da evolução histórica da democracia ateniense.

Não obstante as reformas de Clístenes, ultrapassada a ameaça persa em 490 a.C. e, posteriormente, em 480 a.C., Atenas continua a ser uma polis em constante conflito interno, onde as facções aristocráticas continuam a lutar pelo poder. É neste cenário que emergem figuras como Címon, Efialtes e Péricles.

Címon, filho do vencedor de Maratona, Mílciades, consegue o apoio popular graças a um conjunto de vitórias e à propaganda gerada em torno do episódio dos restos mortais de Teseu, fundador mítico de Atenas, que teriam sido trazidos por si para a cidade, bem como do mito gerado à volta de Maratona. Era, segundo as fontes, um conservador a quem desagradava o caminho que tomava a democracia ateniense, tendo tentado travar, senão mesmo fazer regredir, a tendência evolutiva que a caracterizava. Apercebendo-se da importância que os tetas, membros da classe censitária com menos rendimentos, haviam adquirido na democracia ateniense, graças ao prestígio acumulado nas Guerras Pérsicas e em consequência de constituírem peças chave na frota que era fundamental à defesa da cidade e à manutenção do seu império, resultante do papel de líder que Atenas ocupava na Liga de Delos, irá procurar desviá-los da vida política, afastando-os de Atenas através da criação de cleruquias (colónias dependentes da metrópole), onde lhes distribuía terras. Desta forma, por um lado, afastava os tetas da cidade, enquanto que, por outro lado, através da distribuição das referidas terras, conseguia ir de encontro às suas reivindicações. No entanto, esta actuação acabou por sofrer duros golpes com o massacre, em 465/464 a.C., dos colonos de uma cleruquia em Trabescos e com a revolta de Tasos em 465 a.C., que Címon só consegue reconquistar dois anos após o cerco (reveses que são aproveitados pelos seus adversários, entre os quais se destacam Efialtes, eleito Estratego em 465/464 a.C., e Péricles, que no seu regresso de Tasos o acusam de traição).

Em 462 a.C., apesar da oposição da facção democrática, encabeçada por Efialtes, Címon parte com um contingente de quatro mil hoplitas para auxiliar Esparta, que se encontrava a braços com uma revolta de hilotas. Segundo Plutarco (Címon 16.9), Efialtes, na Assembleia que discutiu o envio de apoio militar para Esparta, justifica a sua oposição alegando que os atenienses não deveriam ajudar uma cidade que era sua rival e que, pelo contrário, deveriam deixar afundar o orgulho espartano.

Ao chegar a Esparta, a força ateniense é acolhida com desconfiança e, consequentemente, devolvida à procedência sem ter sido utilizada. Este fato é usado pela facção democrática, nomeadamente pelo seu líder Efialtes, para demonstrar junto da Ecclesia que Címon não havia tido razão ao tentar apoiar militarmente Esparta e que esta, ao mandar regressar os quatro mil hoplitas atenienses, havia desrespeitado Atenas. Na sequência deste episódio, Címon perde a sua influência e credibilidade.

Ainda em 462 a.C., Efialtes, aproveitando a ausência de Címon, lidera um movimento que preconizava significativas reformas internas, conseguindo a aprovação de uma lei que retirava ao Areópago, órgão controlado pela aristocracia e tendencialmente conservador, a maioria dos seus poderes. Efialtes e os seus partidários consideravam que Atenas se encontrava nas mãos da aristocracia e que o dêmos não tinha possibilidades para participar no governo da polis. Assim, tendo constatado que o bastião dessas famílias aristocráticas se encontrava no Areópago, órgão que sobrevivera às reformas Clístenes e que detinha poderes extensos, capazes de inviabilizar as medidas populares (deteria, entre outros, o poder de fiscalizar as leis aprovadas pela Ecclesia, o poder de controlo das magistraturas e poderes judiciários extensos), irá propor uma série de medidas com vista a diminuir os poderes deste órgão. Para Efialtes e Péricles era contra o espírito democrático o fato de tão importantes poderes estarem nas mãos do Areópago, órgão aristocrático e constituído por membros vitalícios, pelo que procuram demonstrar que os poderes por ele detidos eram o resultado de uma usurpação, já que não era possível argumentar que antes de Sólon o Areópago possuísse determinados poderes. Com o objetivo de desacreditar aquele órgão, Efialtes e Péricles começam por intentar processos individuais contra alguns dos seus membros, acusando-os de corrupção. Em seguida, Efialtes apresenta à aprovação da Ecclesia uma série de medidas que reduzem drasticamente os poderes do Areópago, privando-o das funções legislativas e judiciais que possuía, deixando-lhe apenas o direito de julgar casos de homicídio e crimes religiosos. Todos os outros poderes são transferidos para a Ecclesia, para a Boulê e para a Helieia, que se caracterizam por serem órgãos democráticos por excelência. Mais importante do que esta transferência de competências é o fato de esta reforma, ao enfraquecer uma autoridade que tinha o poder de inviabilizar medidas mais populares na polis, abrir caminho para futuras reformas.

Ao regressar de Esparta, Címon tenta ainda opor-se à reforma em questão, mas sem qualquer êxito. O revés acabado de sofrer, tal como se refere anteriormente, foi bem aproveitado pelos seus adversários e em 461 a.C. Címon é alvo de um processo de ostracismo e condenado a dez anos de exílio. A reforma levada a cabo por Efialtes e pelos seus pares estava consolidada. Com esta reforma, Efialtes tinha desafiado as classes dirigentes e, apesar de ter o dêmos a seu favor, levantou violentas hostilidades em Atenas, que conduzirão ao seu assassinato em 461 a.C.

Conforme refiro anteriormente, Atenas é uma polis em conflito constante, onde existe uma grande luta entre as famílias aristocráticas pelo poder na cidade, sendo na sequência dessas lutas que vão surgindo as reformas políticas em Atenas e que o dêmos vai ganhando cada vez mais poder. É neste contexto que surge a reforma de Efialtes, que, tal como também já referi, é, em minha opinião, uma consequência lógica da evolução histórica da democracia ateniense. Efialtes tinha desafiado as classes dirigentes e, apesar de ter o dêmos a seu favor, levantou violentas hostilidades em Atenas, que culminaram com o seu assassinato em 461 a.C., às mãos de, segundo Aristóteles, na Constituição dos Atenienses, Aristódico de Tanagra.

No entanto, embora Aristóteles, que viveu no século IV a.C., nos forneça o nome do assassino de Efialtes, o fato é que na altura do sucedido, e ao longo do século V a.C., o responsável nunca foi identificado, o que revela a possível e, em minha opinião, quase certa maquinação de um grupo de conspiradores que terão conseguido ocultar a identificação do assassino em questão. O assassinato acabou por ser a opção escolhida, porque Efialtes gozava de um forte apoio popular em Atenas, fato que inviabilizaria qualquer tentativa de ostracismo, uma vez que implicaria a aprovação por parte da Ecclesia.

Notas

1 Em Atenas já existiam o Areópago (Conselho composto pelos ex-Arcontes [que eram aristocratas], cujas funções seriam, entre outras, controlar as leis [verificar se não iam contra a polis] e julgar crimes de sangue) e a Ecclesia (Assembleia dos Cidadãos, cuja função principal, entre outras, seria aprovar as leis da polis). Relativamente ao Areópago, convém salientar que, segundo alguns autores, terá sido com Sólon que esta instituição passou a ser constituída pelos ex-Arcontes.

2 Boulê – Conselho composto por quatrocentos cidadãos atenienses, cuja eleição seria anual, e que teria, entre outras, a função de preparar as leis que seriam posteriormente submetidas a aprovação na Ecclesia.

3 Helieia – Tribunal de jurados, para o qual seriam eleitos anualmente cerca de seis mil cidadãos, de entre aqueles com mais de trinta anos de idade.

4 Assim, o exercício do cargo de Arconte e o assento no Areópago ficava aberto às duas primeiras classes censitárias, com rendimentos mais elevados. O acesso ao serviço militar como Hoplita, bem como o assento na Boulê, ficava aberto às três primeiras classes censitárias, enquanto o acesso à marinha de guerra ficava reservado aos membros da quarta classe censitária, que seria a com menores rendimentos. Na Ecclesia e na Helieia teriam assento os cidadãos das quatro classes censitárias.

Bibliografia

The Oxford Classical Dictionary, Ed. by Simon HORNBLOWER and Anthony SPAWFORTH. Oxford. 1999.

The Cambridge Ancient History (2nd Ed.). Ed. by D. M. LEWIS, John BOARDMAN, J. K. DAVIES, M. OSTWALD. The Fifth Century B.C., Volume V, Cambridge. 1992.

MOSSÉ, Claude e SCHNAPP-GOURBEILLON, Annie. Síntese de História Grega. Tradução de Carlos Barreto e Revisão Científica de Amílcar Guerra. 1994. Porto: Edições Asa.

FERREIRA, José Ribeiro. “A Democracia Ateniense. A busca da igualdade.”, in A Grécia Arcaica. Sociedade e Política, Lisboa, 85-125.

Christopher W. Blackwell, “Ephialtes,” in C.W. Blackwell, ed., Dēmos: Classical Athenian Democracy (A. Mahoney and R. Scaife, edd., The Stoa: a consortium for electronic publication in the humanities [www.stoa.org]) edition of January 27, 2003.

Ephialtes. (2008, December 30). In Wikipedia, The Free Encyclopedia. Retrieved 22:46, January 10, 2009, from http://en.wikipedia.org/w/index.php?title=Ephialtes&oldid=260975315.

ARISTÓTELES. Constituição dos Atenienses. Introdução, tradução do original grego e notas de Delfim Ferreira Leão. 2003. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.

Lives/Solon. (2008, April 6). In Wikisource, The Free Library. Retrieved 23:40, January 11, 2009, from http://en.wikisource.org/w/index.php?title=Lives/Solon&oldid=620150.

Lives/Cimon. (2008, April 6). In Wikisource, The Free Library. Retrieved 22:50, January 10, 2009, from http://en.wikisource.org/w/index.php?title=Lives/Cimon&oldid=620138.

Lives/Pericles. (2008, April 6). In Wikisource, The Free Library. Retrieved 22:54, January 10, 2009, from http://en.wikisource.org/w/index.php title=Lives/Pericles&oldid=620152.

ÉSQUILO. Oresteia. Introdução, tradução e notas de Manuel de Oliveira Pulquério. 1998. Lisboa: Edições 70, Ltda.

Que papel Clístenes desempenhou ao estabelecer democracia em Atenas?

RESPOSTA: Clístenes foi responsável por liderar a queda da tirania em Atenas e implementar reformas que limitaram o poder da aristocracia. Ele também modificou os critérios para organizar a sociedade ateniense, estabeleceu a igualdade perante a lei, aumentou o número de membros da Bulé e instituiu o ostracismo.

Quem não tinha o direito de cidadania em Atenas?

Somente os homens livres, de pai e mãe ateniense, maiores de 18 anos e nascidos na cidade eram considerados cidadãos. As mulheres, escravos e estrangeiros não desfrutavam de nenhum tipo de participação política.

Como se desenvolveu a democracia na cidade de Atenas?

Democracia ateniense No século VI a.C., a Atenas transformou-se no berço da democracia por meio das reformas de Clístenes. O desenvolvimento de Atenas deu-se por um processo de concentração de renda, o que fez com que um grupo de privilegiados, os eupátridas, detivessem a riqueza e controlassem a política da cidade.

Quais são os três princípios que definem a organização da democracia ateniense?

A democracia ateniense é fundamentada pelos princípios de isonomia, isegoria e isocracia.