"Brasil" foi composta por Cazuza, George Israel e Nilo Romero no final dos anos oitenta (mais precisamente em 1988). A música foi uma espécie de manifesto político e social criado em um momento muito particular da história do país. Tratava-se do período de redemocratização do Brasil, queríamos deixar para trás o passado marcado pela ditadura militar e caminhar em direção a um futuro livre e democrático. A canção é a sexta faixa do CD Ideologia, lançado em 1988. Estima-se que até hoje o álbum tenha vendido mais de 2 milhões de cópias, um número impressionante para o mercado nacional. Letra
A letra revoltada de Cazuza denuncia a desigualdade financeira, as injustiças sociais e o comportamento corrupto da classe política brasileira. Ela foi criada na transição da ditadura para o regime democrático, quando a população clamava pela implantação do voto direto.
A festa pobre, referida na canção, remonta ao período do colégio eleitoral montado para a implementação do voto indireto. De fato, o candidato Tancredo Neves, futuro presidente do Brasil com posse marcada para março de 1985, seria eleito por via indireta, sem a participação da vontade popular. Tancredo morreu antes de tomar posse e quem assumiu o comando do país entre 15 de março de 1985 a 15 de março de 1990 foi José Sarney. Vale lembrar que o ano da criação de "Brasil" foi também o ano da criação da Constituição Federal. O documento foi essencial para a consolidação de novas bases para o país após anos de um regime cruel e que se impunha pela força. Aquilo que a mídia da altura denominou de "festa da democracia" foi rebatizada por Cazuza como a "festa pobre", de modo a demonstrar a sua insatisfação pessoal com o rumo do país. A letra é, portanto, não só uma crítica aos políticos como também uma crítica à mídia. A letra é muito significativa porque, ao mesmo tempo que celebra os direitos conquistados com a queda da ditadura, demonstra a indignação de ainda não se ter politicamente o futuro que se desejava. O refrão
seria impossível ser cantado durante os anos de chumbo da ditadura militar, período marcado pela censura extrema, pelo exílio de artistas e pela tortura e expulsão de intelectuais. Os versos estimulam o povo a deixar o medo para trás e a se expressarem livremente, sem receios de reprimendas. Há quem interprete esse trecho da música como um incentivo para que os políticos realmente mostrassem aquilo que, de fato, eram, deixando finalmente a vista a real face, transparecendo as ideologias que os moviam sem medo de retaliações. A letra continua por fazer referência a esse período trágico da nossa história e alude aqueles que financiaram a nossa desgraça. Quando Cazuza diz:
está fazendo uma clara alusão aos países imperialistas que financiaram a ditadura militar na América Latina (Brasil, Chile, Argentina...). Hoje já se sabe (e naquela altura se desconfiava), que os Estados Unidos estavam por trás da política daquilo que consideravam terceiro mundo fomentando guerras e influenciando a queda ou ascensão de presidentes. Quando o compositor diz:
se refere a vida cotidiana de grande parte dos brasileiros na altura que, com dificuldade de pagar as contas básicas, recorriam ao cartão de crédito como solução. A estratégia aparentemente simples fazia com que se vissem endividados ao final do mês, reféns de juros altíssimos. Num período em que escândalos políticos faziam parte do cotidiano da população, a música valente de Cazuza é um hino de basta e de revolta. Infelizmente podemos afirmar que, em se tratando do cenário político atual, a letra de Cazuza permanece extremamente contemporânea e continua colocando o dedo na ferida dos pontos chave do nosso país. Bastidores da criaçãoNilo Romero, um dos parceiros de Cazuza na criação da canção, destacou a respeito da composição:
A música "Brasil" foi feita originalmente para o filme "Rádio Pirata", de Lael Rodrigues. No entanto, ficou mesmo conhecida na voz de Gal Costa ao fazer parte da abertura da novela da rede Globo "Vale tudo". Mas não foi apenas pela chamada da novela de autoria de Gilberto Braga e Agnaldo Silva que a música de Cazuza ficou consagrada no país. No dia 6 de janeiro de 1989, o último capítulo ansiosamente esperado de Vale tudo levou ao ar uma cena que entrou para a história da dramaturgia. O vilão, Marco Aurélio, então interpretado por Regildo Faria, pegou um jatinho particular e fugiu do Brasil, dando uma banana para quem assistia a cena. Sabe qual foi a trilha sonora escolhida para ilustrar o momento? Brasil mostra a tua cara. Contexto históricoEm outubro de 1988, mesmo ano da criação da música "Brasil mostra a tua cara", instaurava-se no país a Constituição Cidadã, responsável por democratizar o país após tantos anos de uma severa ditadura militar. O período também foi marcado pelas Diretas Já, movimento que aspirava eleições diretas em 1985. O povo queria poder votar diretamente em um dos três possíveis presidentes: Paulo Maluf (candidato do PDS), Ulysses Guimarães (candidato do PMDB) e Tancredo Neves (candidato do PP). Cazuza era publicamente contra o colégio eleitoral, que desejava eleger um candidato a presidente por via indireta. Álbum IdeologiaO terceiro álbum solo de Cazuza, que abriga a canção Brasil, é intitulado Ideologia e foi lançado em 1988 pela gravadora Philips Records. A produção, realizada por Cazuza, Nilo Romero e Ezequiel Neves, recebeu o Prêmio Sharp de melhor álbum do ano. A respeito da criação, Cazuza afirmou em entrevista concedida na altura:
A banda que gravou o álbum Ideologia era composta por:
A capa fora idealizada por Luiz Zerbini e carregava uma série de símbolos profundamente distintos, desde a suástica, até o símbolo Peace and Love e a foice e o martelo. As faixas do álbum são as seguintes: 1) Ideologia Cultura Genial no SpotifyConheça também
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